quarta-feira, 30 de março de 2011

Adultério

        
        Numa saída de escola.
Eu ali,parada, com uma idéia fixa na cabeça. 
Pele firme, cabelos na cabeça, espinha na cara, olhar assustado. Tudo que eu queria era gozar, mas gozar de um jeito avassalador, essas avassalações só acontecem quando surpreendo ou sou surpreendida ali, na hora, na cama. É impossível julgar o desempenho sexual de uma pessoa apenas olhando para ela e seu membro, por maior que seja.
Me deixei olhar por alguns jovens que saiam da escola, alguns tinham suas namoradinhas coroinhas à tira-colo, outros me olhavam com nojo, e alguns, apenas alguns poucos me desejaram. Eu escolhi um.
Usava óculos e tinha traços de menino virgem. Carregava, ao invés da tradicional mochila, uma pasta de couro velha, e ao invés de tênis, usava sapatos. Suas calças eram um pouco curtas, o que indicava, ou mal gosto, ou que crescia rápido demais, ou que sua família não tinha condições de vesti-lo adequadamente.
Há mais de dez anos meu marido não me fazia gozar, este fardo me dava um impulso, que dizia em minha mente que aquilo não era errado, era apenas questão de sobrevivência, questão de manter a sanidade, a auto-estima e os modos, tinha receio da histeria, doença seríssima. Não tinha a ver com amor ou gratidão, como em meu casamento severo. 
Eu sabia das escapadas do meu marido, mas ele, não.
Comecei a ir diariamente a um café que ficava do lado da saída da escola. Fumava e esperava, quando o calças curtas saía eu apenas o sorria. Ao cabo de três meses de visitas diárias ele já me cumprimentava com empolgação. Então eu sumi. Por duas semanas tudo que ele via quando saía da escola eram seus colegas ordinários, ele não era desses, era especial.
Após a abdicação calculada, apareci novamente na porta da escola, desta vez em meu carro. Abri o vidro fumê e apenas acenei, sem sorriso.
Ele correu ate o carro, parou em frente a minha janela. Ficou mudo olhando nos meus olhos e uma gota de suor violenta lhe atravessou a testa. Era inteligente, sabia que tal gota havia lhe entregado a mim, o deixado vulnerável, mas sabia também de suas possibilidades certamente positivas, deu a volta no carro e entrou. Percebi que estava quase por cuspir seu coração, agora as gotas desciam mais velozes através de sua face sem pêlos. Sentou-se no banco da frente, eu decidi leva-lo a um motel, e decidi também que só falaria alguma coisa se ele falasse primeiro. 
O caminho até o motel foi silencioso. Eu coloquei minha mão direita levemente sobre sua perna esquerda depois de passar a marcha. Ele estremeceu, estava morrendo de medo, eu chamo de excitação. 
Chegamos ao motel, entramos no quarto e quando eu o encostei, ele ainda de roupas e segurando com a vida aquela pasta de couro, gozou. Pobre coitado. Achei fofo.
Eu ri, tirei suas calças curtas, sua cueca de pré adolescente e o chupei, com gozo e tudo. Ele respirava ofegante, seu óculos chegavam a embaçar. Ele largou a pasta e acariciou de leve meus cabelos, já brancos, apenas com as pontas dos dedos suados. Neste momento, ele, por conta própria tirou a camisa. Seu pau já estava muito duro, quando o olhei percebi que tinha um corpo lindo, lembrava o corpo do meu general quando nos casamos em Budapeste.
Eu o empurrei em direção a cama, ele caiu no chão pois estava com os tornozelos presos nas calças curtas. Tirou rapidamente sapatos, meias e calças curtas, pulou pra cima da cama de joelhos, abriu os braços e disse: você é linda.
 Eu tomada por tal elogio, comecei a me despir, calmamente. Seu olhar havia se transformado, estava com um tom malicioso e era pura potência, muito diferente do menino esguio de calças curtas que eu havia perseguido por dois meses, o sexo faz isso com as pessoas. Eu o beijei. Ele beijava e gemia. Achei gracioso.
Nossos corpos nus eram excitação, desejo, paixão, os lençóis da cama já estava revirados, nós suávamos juntos, nos beijávamos.
Pele firme, rugas, cabelos brancos ou ainda negros, nada tinha importância, era sexo. Sexo real, verdadeiro. Quando se vive um tipo de relação tão intensa quanto a penetração, os corpos se transformam em um só, todos os dogmas, tabus, personas caem por terra, nada mais além do prazer se sustenta na cama. Entre quatro paredes, tudo pode. 
Ele beijou cada centímetro do meu corpo que deitado parecia menos flácido. Estava apaixonado, pude ver. Sua penetração era intensa, cheia de tesão. Estava determinado a cumprir com seu papel de homem, mesmo sendo um menino. Me penetrou de todos os jeitos possíveis que assistira em seus filmes pornográficos. Acho pornografia perda de tempo, puro ensaio sem estréia. 
Sexo.
Sexo.
Sexo.
Ele gozou. Eu também.
Deixou seu corpo cansado desabar sobre o meu. Tomou ar...
Foi tomar banho, eu me vesti, pedi um espumante e cigarros para ele, deixei dinheiro para ele pegar um taxi, desci, paguei a conta e fui embora.
Nunca mais vi.
Portas de escola não me apetecem mais. 
Foi pontual, inédito e único. Intenso e perverso, do jeito que deveria ser.


MARIA CLÔ

quinta-feira, 24 de março de 2011

EMPEREQUETADA



Nos meus vinte e poucos anos eu sonhava em ser dançarina, mas não uma dançarina comum, dessas que preenchem o fundo de programas de auditório ou dessas que fazem intermináveis pliês. 
Queria algo a mais, um certo glamour. 
Queria ser uma dançarina de cabaré; pura fascinação por plumas, e anáguas, corsets e copos de matinis. Me imaginava no palco, tirando peça por peça de roupa, os homens arrebatados; eu de batom vermelho, cinta-liga e muito laquê, som de saxofone e puro jazz. 
Nessa época as pessoas não ouviam tanto jazz, a sofisticação havia ficado em segundo plano; ninguém se penteava mais desde 67, mas eu, não. Eu continuava dormindo com amarração, acordava sempre com lindos cachos, usava pó de arroz no rosto, mas não precisava ainda enrubrecer minhas bochechas, pois a juventude ainda fazia isso por mim, tinha uma pele ótima, apenas usava batom vermelho e um fino traço preto por sobre os cílios. Parecia deslocada? Sim, mas não me importava; ostentava um longa cigarrilha preta dentro do trem enquanto ia para meu emprego mediano. Que obviamente não merecia tanto emperequetamento.
Naquele dia enquanto voltava para casa uma idéia me martelava: Porque tanto enperequetamento? Ninguém liga, ninguém vê.

Vou parar com isso.
Não.
Não! Eu vou é mostrar isso.
Entrei no primeiro bar, que coincidentemente estava bem na minha frente no exato momento em que conclui meu pensamento.
Me deixei embebedar.
Pensava: Há mais de três anos usava espartilhos e combinação sem nenhum homem jamais ter visto tais enfeites, estava no auge dos meus 22 anos, meu corpo estava lindo, meu rosto luminoso. Porque não virar dançarina? Ali mesmo, no bar. 
Em 71 as pessoas tiravam suas roupas na rua mesmo, as estudantes adoravam "protestar".
Decidi.
Um gole mais pra tomar coragem. Talvez dois goles pra tomar coragem. Dessa vez, o gole é duplo, está bem, mais um então seguindo meus instintos. 
Não conseguia parar de beber. Estava muito nervosa. De  repente: Jazz! 
Começou devagar, eu só me levantei, com um olhar fulminante, para todos presentes no bar. Mexi meu quadril, subi no balcão, tirei peça por peça de roupa. Numa empolgarão tão misteriosa e controlada, com movimentos fluentes que de certa forma lembravam o ato sexual. Naquele dia eu estava especialmente arrumada, a lá filme mudo dos anos 50. Desfiz laços, abri botões, mexi todo o corpo, suei, sorri, e me senti muito desejada.
A música acabou. 
Eu me sentia completamente nua. Apenas calcinha, soutian, minhas pérolas e meia na perna esquerda escoltavam os mamilos e pelos pubianos, que seriam em breve os próximos a serem exibidos naquele súbito. 
Deprimente. 
Desci do balcão, todos me olhavam, eu me vesti rapidamente, por último coloquei meus óculos e peguei minha bolsa, saí sem pagar a bebida. Tudo bem, volto e pago depois.
Não, não! Vou voltar e  pagar! 
Contei o dinheiro na rua mesmo. Tomei um ar e voltei, joguei o dinheiro no balcão, um cara passou a mão na minha bunda.
Eu xinguei. Ele segurou meu braço e me olhou fundo nos olhos e seios. Consegui me soltar e saí. Meu coração quase saiu pela boca e minha adrenalina estava a mil. 
Minha pintura e laquê estavam derretidos. Dó de mim. 
Sai quase que correndo.
Depois um pouco mais depressa.
Ok, sapatos na mão e corri até em casa, num acesso, não costumo ser atlética, uso saltos. Observem, a única mulher que usava salto e soutian da cidade estava, naquele momento, correndo desesperada com sapatos, uma meia na mão, bolsa aberta e casaco do lado contrário. Cheguei em casa esbaforida. 
O bar era perto de casa, passava por ele todo dia na volta do trabalho.
E agora? Como votaria diariamente para casa?
Pensei a noite inteira enquanto colocava pepinos no olhos e escaldava os pés. 
De manhã, já tinha uma resposta. Vou me camuflar. 
Tinha uma vizinha heppie. Bati em sua porta 6 da manhã. Ela não atendeu, e quando desisti, a vi subindo as escada, chegando de manhã em casa; ela, completamente bêbada, certamente não lembraria de nada. Eu a interpelei: me dê suas roupas?
Ela simplesmente tirou a roupa, ali, no corredor, toda a roupa, mesmo. 
Eu… 
Eu entrei na minha casa, um misto de euforia e nojo. Totalmente estupefada com o que a invenção da pílula anticoncepcional havia feito com as mulheres e seus pudores. E comecei a me vestir de trapo, a vizinha bateu na porta nua, eu abri, ela enfiou a mão no meu bolso, pegou suas chaves e sorriu.
Naquela manhã, nada de laquê, batom, nada de salto, corsert, nada de perfume, laços, amarrações, soutian. nada.
Eu bebi café por tediosa e interminável uma hora. 
Fui para o trabalho, ninguém notou a mudança. Na rua ninguém me olhava, me via, nem estranhamento, nem desdém, nem interesse, nada, somente a indiferença. No começo achei bom, mas depois me deu saudade. 
Meses se passaram, eu passei umas 80 vezes na frente daquele infeliz bar, ninguém me olhou. 
Certo dia… Vontade de dançar, porque não?
O que há de tão errado nisso?
Ué, tudo de errado, RISCOS.
Fui para casa, minha cabeça me questionava, mas meu corpo estava exalando tesão, um tesão enrustido de menina de 22 anos ainda virgem. E o impulso também era de menina, inconseqüente que era, comecei a me vestir, pensava: ah, é só pra mim, não vou sair de casa, vou me vestir, me pintar e me masturbar.
Me vesti, me pintei e não me masturbei. Fui para o bar. Sem pensar, abri a porta e fui.
Entrei no bar e disse: Por favor, um martini e um jazz. Não gostava de martini, preferia uísque, mas tinha uma imagem de sensualidade que envolvia aquele copo. O barram fortão e tatuado sorriu. Me serviu e disse que podia ficar a vontade. O martini saiu por conta da casa, e por conta de meu charme também. Saiu também por conta das outras 6 doses de uísque que bebi e paguei em dinheiro após o número de dança que apresentei naquela noite.
Desde então,oito anos se passaram de uma vida dupla, de dia emprego tedioso, decorando bolos de noiva e abrindo massas de foundant tão brancas e iguais que já perderam a doçura e o encanto. A noite diva do jazz em uma bar escuro, com números burlescos repletos de plumas e paetês. Banda ao vivo, eles são os meus garotos e sabem disso, o trompetista ostenta com orgulho uma renda de combinação dependurado em seu instrumento. Homens gritando e mulheres olhando intensamente, elas gostariam de estar no meu lugar. Porém, as mulheres que tinham tamanho bom gosto já haviam sido pegas pelo tempo e gravidade. 
Foi a melhor época da minha vida.
Até meus peitos caírem. Parei de dançar. E me mudei para o brasil. Tive um filho. Anos se passaram. 
Ainda sou sofisticada. Ainda uso espartilho, mas apenas em dias de festa.
Minha neta veio esses dias dizer que quer dançar. 
        Irei assegurar-me que jamais escute o som do jazz.
        Ele corrompe as pessoas.



MARIA CLÔ